Uso de charretes em cidades históricas gera divergência

por André Candreva publicado 27/03/2018 13h53, última modificação 27/03/2018 13h53

Fonte: ALMG

 

Os charmosos passeios de charrete em cidades históricas fazem parte de uma tradição cultural que não deve ser perdida ou podem dar espaço a outras práticas que não trazem desconforto aos cavalos? Participantes de audiência conjunta das Comissões Extraordinária de Proteção dos Animais e de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta quinta-feira (26/10/17), não chegaram a um consenso sobre a questão.

 

Os defensores da utilização das charretes, como os deputados Ivair Nogueira (PMDB) e Fabiano Tolentino (PSB), argumentam que os passeios são atrativos turísticos, fomentam a economia dos municípios e contribuem para a mobilidade urbana.

 

Abordando especificamente a situação na cidade de Tiradentes (Região Central do Estado), que deu origem à discussão, Ivair Nogueira ressaltou que a prática já ocorre por lá há 40 anos e é responsável pelo sustento das famílias de 30 charreteiros.

 

Para o deputado, eventuais desvios, como o tratamento inadequado dos animais, devem ser combatidos com ações de conscientização e fiscalização, e não com o veto aos passeios. “Os justos não podem pagar pelos pecadores. Os próprios turistas não querem ver animais maltratados”, salientou.

 

Fabiano Tolentino ponderou que é difícil andar de carro em Tiradentes, com suas ruas formadas por pedras grandes e pontiagudas. Ele também lembrou que a região é um dos berços das raças de cavalo marchadores, que fazem parte da história local.

 

O advogado Victor Alessandro Carvalho, representante dos charreteiros, disse se considerar um protetor dos animais. No seu entender, o uso das charretes está intimamente ligado a uma relação de carinho entre os profissionais e os cavalos. “Naturalmente, há desvios. Que essas pessoas sejam punidas”, ratificou.

 

Acompanhamento – Vice-prefeito de Tiradentes, Luiz Carlos Barbosa, também favorável às charretes, informou que a administração municipal contratou um veterinário para prestar assistência aos charreteiros e está providenciando um espaço onde possam ser instaladas baias. A ideia é que os cavalos possam descansar e se alimentarem no local no intervalo dos passeios.

 

Tradição não pode ser obstáculo à revisão dos costumes

 

Os críticos à utilização dos veículos de tração animal, por outro lado, afirmam ser inconcebível que a tradição histórico-cultural sirva de justificativa para maus-tratos aos animais. Segundo eles, a substituição dos cavalos por veículos motorizados trariam apenas benefícios às famílias que ganham a vida com o turismo na região.

 

O deputado Noraldino Júnior (PSC), entusiasta da causa e que solicitou a audiência, inclusive sugeriu à Prefeitura de Tiradentes a adoção de um projeto-piloto no município. A ideia é substituir, gradativamente, os animais por quadriciclos. Os veículos disponibilizados para que a iniciativa seja testada seriam custeados com emendas parlamentares de sua autoria.

 

Noraldino Júnior contou ter presenciado, em visitas à cidade, agressões a cavalos, que também sofreriam com a sobrecarga de peso – às vezes, famílias inteiras seriam transportadas pelas charretes.

 

Outro ponto abordado pelo parlamentar é o destino desses cavalos, comumente abandonados ou vendidos para abates clandestinos quando não possuem mais condições físicas para o trabalho.

 

Maus-tratos – Membro do Núcleo de Assistência à Saúde Veterinária da Polícia Militar, Bárbara Goloubeff relatou não ser incomum encontrar animais desnutridos, doentes e exaustos sendo obrigados a carregar peso. “Não tem cavalos marchadores puxando charrete. Os de pequeno porte é que são submetidos a esse trabalho”, observou.

 

Em relação à tradição dos passeios de charretes nas cidades históricas, ela lembrou que lutas mortais entre gladiadores e outras práticas hoje consideradas absurdas já foram parte importante da cultura de muitas sociedades. “Em Paquetá (RJ), há veículos movidos à energia solar estilizados para parecerem charretes”, citou, como um exemplo que pode ser seguido.

 

Ativista alega ter sido agredida por charreteiros

 

A audiência também foi convocada para que fosse discutida a agressão sofrida pela protetora dos animais Luanda Conrado. Um mal-entendido estaria por trás do incidente: Luanda participou, com o deputado Noraldino Júnior, de reunião na Prefeitura de Tiradentes sobre a castração gratuita de animais abandonados.

 

Os charreteiros, no entanto, acreditavam ser ela a responsável por levantar a questão da proibição dos passeios de charrete no município, iniciativa encampada pelo parlamentar. Luanda afirma que ela e seu marido foram encurralados na rua e agredidos. Ela mostrou vídeos do incidente e áudios de charreteiros se vangloriando por tê-los repreendido de maneira agressiva.

 

Todos os participantes da audiência destacaram a gravidade do fato e condenaram as agressões. “Já fizeram o mesmo com jornalistas, donos de pousadas e outros ativistas. Não tive o apoio de nenhuma autoridade da cidade”, relatou Luanda. “Já que me colocaram no meio dessa questão das charretes, me prontifico a defender os cavalos de abusos”, acrescentou.