Tratamentos buscam levar qualidade de vida a pacientes de epilepsia

por André Candreva publicado 26/03/2018 20h17, última modificação 26/03/2018 20h17

Fonte: Jornal OTEMPO

 
 
Cerca de 8 milhões de brasileiros são portadores de epilepsia – doença neurológica em que a atividade elétrica do cérebro fica fora do normal, causando sintomas que vão de crises de ausência a convulsões. Apesar de em 70% dos casos a doença poder ser controlada com medicamentos que agem estabilizando o fluxo de energia do cérebro, o tema ainda é rodeado de preconceitos.
 
“Nos consultórios, há casos de pacientes que são mandados embora do trabalho por terem epilepsia”, relata a neurofisiologista clínica Andréa Julião de Oliveira, do Núcleo Avançado de Tratamento das Epilepsias do Hospital Felício Rocho e porta-voz da Liga Brasileira de Epilepsia (LBE).
 
Para o controle da epilepsia nos 30% de casos em que os remédios não são suficientes, há alternativas, como a cirurgia. Nela, a região cerebral afetada é retirada, ou eletrodos são implantados dentro ou próximos do cérebro. Esses eletrodos disparam pequenas descargas elétricas que regulam a atividade neuronal.
 
Esse procedimento mudou a vida da analista de recursos humanos Alice Alcântara, 35. “Em 2010, passei por um período no qual as crises epilépticas não estavam controladas e eu já tomava a quantidade máxima de medicação que eu aguentava. Decidi preparar-me psicologicamente para encarar a cirurgia”, conta.
 
Ela se submeteu à operação em 2012 e removeu a esclerose hipocampal (lesão cerebral), causadora da síndrome. “Crises são coisas do passado. A qualidade de vida melhorou consideravelmente: comunicação, espontaneidade, relacionamento interpessoal, interação”, comemora ela, que já está quase livre do segundo medicamento.
 
Canabidiol. Uma substância que tem mostrado bons resultados no controle de síndromes convulsivas é o canabidiol (CBD), extraído da maconha. Apesar de mais de 50 famílias já o estarem usando no país, a aprovação do CBD não é unânime.
 
“Ainda é controverso, pois não podemos descartar, nem defender. O fato de ele ter bons resultados em experimentos nos primeiros casos ainda não nos dá a medida de segurança. Antes de ser aprovado, um remédio precisa ter sua eficácia e sua segurança comprovadas”, explica Andréa.
 
Molécula. Uma frente de pesquisa liderada pela neurofarmacologista italiana Annamaria Vezzani, do Instituto de Pesquisa Farmacológica Mario Negri, de Milão, tem se mostrado promissora. Os cientistas descobriram a molécula HMGB1, responsável por uma condição inflamatória do cérebro, que predispõe às crises epilépticas.
 
O estudo, realizado em ratos, foi publicado na “Nature”. O próximo passo, agora, é descobrir o funcionamento da molécula em humanos para, posteriormente, poder desenvolver um medicamento bloqueador da HMGB1.
 
 
Flash
 
 
No mundo. Estima-se que de 2% a 4% da população do mundo sofra de epilepsia. A doença pode atingir qualquer pessoa.
 
Doença vira motivação para advogado escrever um livro
 
Aos 14 anos, o advogado Geraldo da Costa Costa começou a ter suas primeiras crises epiléticas. “Assistindo à TV, as imagens embaralhavam. Era uma sensação gostosa”, lembra ele, agora com 57 anos.
 
Já no Exército, ele teve uma crise convulsiva e foi dispensado do serviço militar. Dois anos depois, as crises ficaram frequentes, e ele começou a ser medicado.
 
Apesar da doença, Costa sempre levou uma vida normal e não tem vergonha da epilepsia. Ele, inclusive, já escreveu um livro comparando sua vida com a do escritor russo Fiódor Dostoiévski, também portador de epilepsia.
 
“Faço o relato com bom humor. As pessoas riem e choram com o livro. Por conta dele, já fiz algumas viagens pelo país”, conta Costa, que já prepara uma segunda obra.
 
 
Tipos de crise
 
Convulsão. Não é o tipo mais comum. Há contração involuntária dos músculos e perda de consciência.
 
Ausência. Pessoa fica “aérea”, com o olhar parado.
 
Automatismos. A pessoa faz “doideiras” – tirar a roupa no trabalho, por exemplo –, mas depois não se lembra de nada.
 
Pontuais. Sintomas só em uma parte do corpo, como não mexer uma das mãos.