Projetos de lei ameaçam nascente do Rio São Francisco

por André Candreva publicado 26/03/2018 15h28, última modificação 26/03/2018 15h28

A polêmica sobre a remarcação do Parque Nacional da Serra da Canastra, no Centro-Oeste de Minas, ressuscitou um debate a respeito da nascente do Rio São Francisco. No início desta década, pesquisadores revelaram que o berçário do curso d’água fica fora da unidade de conservação, criada na década de 1970 justamente para protegê-lo. Agora, deputados interessados na aprovação de dois projetos de lei, que reduzem em 25% a área de preservação ambiental, valem-se da descoberta científica para justificar a supressão do território. Afinal, a cabeceira do Velho Chico não está mais lá. Para ambientalistas, o discurso encobre interesses econômicos.

Em 2002, depois de percorrer todo o leito do rio, equipes de pesquisadores concluíram que o que se acreditava por quase dois séculos era uma imprecisão: na verdade, o Rio da Integração Nacional, que corta cinco estados, três biomas e mata a sede de milhões de brasileiros, não nasce entre as belas corredeiras do parque, mas no vizinho Planalto do Araxá, no município de Medeiros, e tem agora 50 quilômetros a mais. Sua origem é o Rio Samburá, onde não há nenhuma norma de proteção ambiental. Depois disso, o São Francisco ganhou o inusitado status de rio com duas nascentes: uma histórica (a antiga) e outra geográfica (a nova).


Para os autores das duas propostas, a reviravolta científica serviu de argumento para diminuir a área do Parque da Canastra. Os textos foram apresentados em 2007 e, mais recentemente, aprovados em comissões. Há três meses, os parlamentares protocolaram outro projeto para proteger a nova nascente do São Francisco, criando o Monumento Natural do Rio Samburá, com 9.356 hectares.

“Os projetos corrigem um erro histórico, uma vez que o parque foi criado para proteger o rio. Mas a verdadeira nascente está a quilômetros dali”, afirma o deputado Carlos Melles (DEM-MG), que também defende as mudanças sob a justificativa de regularizar a situação de proprietários rurais que ocupam a região.

Afluentes

O presidente do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade, Rômulo Mello, diz que a estratégia dos parlamentares é diminuir a importância do parque. “Ele abriga várias outras nascentes, inclusive de afluentes do São Francisco. Na verdade, estão desvalorizando a unidade de conservação para diminuí-la. Se eles estão tão preocupados com a nascente do Samburá, basta um projeto só para protegê-lo. Não entendi o que a redução do parque tem a ver com isso”, critica.

Como o Estado de Minas mostrou ontem, os dois projetos de lei de 2007 diminuem o parque de 197,7 mil hectares para 150,1 mil hectares. Os 47 mil hectares desagregados virariam área de proteção ambiental (APA), tipo de unidade de conservação que permite a exploração econômica. O Parque da Canastra é foco de interesse de mineradoras, inclusive multinacionais, que pretendem explorar diamantes em suas terras; operadoras de turismo; e agropecuaristas. Na condição de parque, qualquer atividade humana é considerada irregular, pois pode destruir a biodiversidade.

 

Fonte: Estaminas