Palacio das Artes recebe exposiçao de tapetes e guirlandas

por André Candreva publicado 26/03/2018 16h21, última modificação 26/03/2018 16h21

Na trama da tela, mãos cuidadosas dão forma a tapetes e guirlandas e, nesse vai e vem da agulha, moldam também outro olhar sobre a vida. São detentos, comunidades de baixa renda, além de grupos da terceira idade, que tiveram a chance de trilhar novo rumo para a própria trajetória, unindo-se em torno do mesmo destino: a arte. Na terça-feira foi dia de consagrar essa virada e abandonar definitivamente a margem da sociedade para ocupar lugar no centro da cultura, com a abertura da exposição Santos caminhos: trilhas e tramas que nos unem.

A mostra reúne até 19 de dezembro, no Palácio das Artes, no Centro de Belo Horizonte, trabalhos de 800 participantes da entidade sociocultural Projeto Fred, voltado para a inserção social de detentos e comunidades carentes. Os 250 tapetes e guirlandas de Natal feitos de retalhos de tecidos foram produzidos a partir da técnica trama sem nó, ao longo de quatro meses, em 22 municípios de Minas. Diante das obras, Eunice Ferreira Gomes, de 53 anos, uma das artistas de Contagem, na Grande BH, revela o tamanho da emoção: “Dá até vontade de chorar”.

Há um ano no projeto, Eunice encontrou nas oficinas de tapetes a rota de fuga para um processo depressivo, que estourou depois de uma separação conturbada. “Comecei a sentir que podia fazer arte e me tornar a primeira artista da família. Meus filhos falam que isso caiu do céu na minha vida, pois me levantou. Não quero mais pensar em depressão”, conta a participante, que já se tornou monitora e coordenadora do Fred.

Em cada canto do estado, alunos mergulharam numa intensa pesquisa sobre azulejos hidráulicos, fachadas, arabescos, igrejas e outras referências cheias de mineiridade. A linha do trem, estampada no chão da galeria, reforça a ligação entre as cidades por onde o projeto passou. “Inicialmente, pensamos num tema que pudesse sensibilizar a todas e chegamos à construção das cidades mineiras. Vimos que todas as cidades eram cortadas pelos trilhos. O trem de ferro costurou o trabalho”, afirma o artista plástico Cícero Miranda, que com Camila Oto coordena a exposição.

Aniversário

A exposição também marca os 12 anos do Projeto Fred, que este ano recebeu a Comenda da Paz, homenagem do governo do estado. A entidade já tirou da zona da exclusão cerca de 20 mil pessoas, entre detentos, jovens em situação de risco e quem buscava uma fonte de renda. A iniciativa surgiu por causa de Frederico Ambrósio, ex-detento e dependente químico, morto em 1998, quatro anos depois de sair da prisão.

Ele era irmão da educadora Andréa Ambrósio, idealizadora do projeto. “Acredito na recuperação das pessoas e, depois da morte do Fred, comecei a desenvolver oficinas de tapetes com os detentos até a Penitenciária Nelson Hungria. É um trabalho voltado para o resgate da autoestima, é preciso dar oportunidade para as pessoas se reestruturarem”, diz. Das penitenciárias para as comunidades carentes, atualmente, o projeto está presente em 22 municípios e já levou tapetes até para a Europa. Com tantos frutos, Andréa tem convicção de que ela é quem mais aprende com o trabalho. “Atendemos pessoas carentes materialmente, mas ricas de afeto.”
 

Fonte: Estaminas