Acordo tenta conciliar preservação do patrimônio com desenvolvimento urbano em Ouro Preto

por André Candreva publicado 26/03/2018 16h19, última modificação 03/02/2020 13h33

Ouro Preto, que no início da década enfrentou a ameaça de perder o título de patrimônio da humanidade conferido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), mostra que deu a volta por cima e, no ano de comemoração dos 30 anos do reconhecimento internacional, sela promessa de conciliar preservação da memória e desenvolvimento urbano. Publicada nessa quarta-feira no Diário Oficial da União (DOU), a portaria normativa do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) traz novas regras para a conservação da área protegida do município. Pela primeira vez no país, as normas de proteção de um sítio tombado são definidas em conjunto pela prefeitura local, Iphan e comunidade.

A portaria muda critérios de construção e reforma dos edifícios na cidade de Ouro Preto, tombada pelo Iphan desde 1938, com o objetivo de promover o crescimento ordenado, sem o prejuízo do conjunto arquitetônico que tornou a cidade, a 95 quilômetros de Belo Horizonte, conhecida mundialmente. Durante três anos, as mudanças nos critérios de conservação do conjunto arquitetônico da antiga Vila Rica foram debatidas por Iphan, prefeitura e população. As propostas de mudanças foram discutidas inclusive em audiências públicas, até que se chegasse a um denominador comum. Segundo o prefeito da cidade, Angelo Oswaldo, muitas vezes o Executivo e o Iphan divergiam em relação ao crescimento urbano e o documento publicado ontem cria uma posição clara para os agentes públicos envolvidos na preservação. “O patrimônio é dinâmico e não pode haver um congelamento”, afirma.

Agora, o município fica divido em áreas e, em cada uma, há definição sobre as características arquitetônicas que devem ser respeitadas. Antes do acordo firmado entre a prefeitura e o Iphan, só o Centro Histórico tinha regulamentação para construções e a limitação de novas edificações dependia de análises pontuais e subjetivas dos técnicos do Iphan. “Agora foram estabelecidas regras em pontos que antes não tinham normas formais. Muitas vezes, o que era determinado para o Centro Histórico também valia para áreas afastadas”, explica a coordenadora de Paisagem Cultural do Iphan, Mônica Mongelli.

De acordo com o secretário municipal de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano, Gabriel Gobbi, essa imprecisão engessava o crescimento da cidade. “Antes, a área máxima de construção permitida era de 450 metros quadrados, independentemente do tamanho do terreno”, exemplifica. As mudanças dividiram de forma mais clara o papel do Executivo e do Iphan. “Agora, é a prefeitura que vai autorizar ou não a construção de um imóvel, definindo o tamanho e o tipo de ocupação. O instituto vai verificar se cor, acabamento, tipo de cobertura e volumetria estão em harmonia com a paisagem cultural e histórica”, afirma Gobbi. Para adequar as regras do município à portaria do Iphan, as revisões do Plano Diretor e da Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo estão em votação na Câmara Municipal.

Características

A portaria também permite modificações maiores na cidade, desde que preservadas as características patrimoniais. “O sítio tombado não é homogêneo e cada área tem aspectos próprios”, afirma Mônica Mongelli. Para dar conta dessas diferenças, a cidade foi dividida em sete regiões, de acordo com a topografia, quantidade de bens culturais, ritmo de urbanização e incidência de áreas verdes, entre outros critérios. Esse conjunto de fatores vai determinar o tipo de construção arquitetônica que cada setor poderá receber. Um exemplo é a área de proteção especial 1 (APE 1), onde ficam o Centro Histórico e os principais monumentos tombados.

Nessa área, a restrição é maior, mas, segundo Mônica, “também são permitidas alterações, se aprovadas em análise pormenorizada”. As mudanças terão que respeitar detalhes de cada quadra. Como grande parte das casas nas ladeiras da cidade histórica são de um pavimento ou sobrados, a regra exige que as edificações não destoem desse padrão. A região que terá maior flexibilização para construções fica distante do Centro Histórico. Ela é denominada área de preservação 3 (AP 3) e, segundo o texto publicado ontem no Diário Oficial da União, compreende “áreas de urbanização recente, pouco ou nada visíveis desde a APE 1, e que possuem áreas verdes remanescentes e de relevante interesse paisagístico”. Nos bairros compreendidos nesse setor, as novas construções poderão ter até 14 metros de altura, com limite de quatro pavimentos.

 

Fonte: Estaminas